Imagino que todos essa semana tenham ouvido da conta de Lula no exterior, denúncia publicada pela Veja.
O que interessa para esse post é o quadradinho publicado... o que afirmava que a revista realizou vários exames do material e não conseguiu estabelecer a veracidade ou falsidade do mesmo.
Interessante tal afirmação, visto que classicamente falso/verdadeiro são um sistema de lógica bivalente - ou seja, na qual uma qualidade exclui a outra. Ou é verdadeiro ou não é... e não ser verdadeiro é ser falso. Esta percepção das características de falso/verdadeiro implica na lógica da prova - se não há provas suficientes da veracidade de um documento contestado, ele é falso.
Ora, a Veja estabeleceu uma situação diversa - o documento possui simultaneamente uma falsidade dúbia e uma veracidade dúbia - ou seja, é como se fosse falso e verdadeiro ao mesmo tempo - o que negaria a proposição da bivalência dessa característica.
O que temos, então, é um aproximar de uma lógica difusa - ou fuzzy logic, para a nossa amiga Marina - na qual as qualidades não são necessariamente auto excludentes, mas estão em um sistema de gradações entre um extremo e outro. Por exemplo - as qualidades de quente e frio possuiriam um gradiente de possibilidades entre um e outro - quente, menos quente, menos quente um tanto, o menos quente possível antes de ser frio, frio; que seriam equivalentes a quente, o menos frio possível antes de ser quente, menos frio um tanto, menos frio, frio.
Assim, quando a Veja estabeleceu uma gradação entre verdadeiro e falso - um documento possuiria graus de verdade e de falsidade - ela se firmou como uma boa revista pós-moderna, desafiando a lógica euclidiana, o pensar do terceiro excluído, da bivalência, demonstrando um mundo de gradações, de tons de cinza.
Mas qual é a diferença entre o que você deveria saber e o que é propaganda? Qual a diferença entre jornalismo e publicidade? Qual a diferença entre o real e o imaginado?
É impossível experienciar tudo. Dependemos de intermediários, de testemunhas para obter esse conhecimento. Não sei o que é a guerra. Não sei o que se passa numa votação. Não sei, simplesmente.
E nós confiamos nessas testemunhas, nesses intermediários, nesses jornalistas.
E isso significa poder, o poder de torcer a realidade de acordo com os seus anseios. Pode ser o que for. Pode ser o lançamento de uma novela, o acompanhamento de um show, o que for. Pode ser uma candidatura a cargo eletivo. Pode ser intencional, podem ser "patos" como nós.
O que entendemos como real é o que apreendemos com os sentidos. Não sentimos tudo. Usamos testemunhas. O que é real para nós é esse testemunho. E os jornais, as revistas, as agências de propaganda, os marketeiros virais, os políticos, as agências de relação pública, todos sabem disso. E mudam o real. Até alcançar o imaginado.
Assim, chegamos as nossas conclusões: Mas qual é a diferença entre o que você deveria saber e o que é propaganda? Nenhuma.
Qual a diferença entre jornalismo e publicidade? Nenhuma.
Qual a diferença entre o real e o imaginado? Nenhuma.
Em uma sociedade de experiências intermediadas, não há real. Não há verdade. Não há mundo fora de nossa subjetividade inchada, inútil, trancada para nós, aberta para todos.